quinta-feira, 22 de abril de 2010

Sobra a "arte" de comprar camisinhas

Crônica publicada no Jornal Matéria Prima - 22/04/2010Esperou a mãe sair de casa e contou mais dez minutos. Depois juntou uma nota de um real amassada, duas moedas de vinte e cinco centavos que recebeu de troco no ônibus e fechou o portão com cuidado para não chamar atenção. Não é porque ele ia comprar camisinhas que todo mundo precisaria ficar sabendo.

Dessa vez seguiu até a avenida. Lá teria alguma farmácia que ainda não visitara. Uma das regras essenciais na “arte” de comprar camisinhas é nunca repetir o estabelecimento. Se você for duas vezes ao mesmo lugar o atendente pode calcular a frequência das suas relações e você corre perigo de ouvir um “E ai parceiro, vamos levar uma de morango pra esta semana?”.

Por sorte encontrou uma porta pequena, com meia dúzia de prateleiras e uma balconista feiosa, acima de qualquer suspeita. Seus amigos sempre o aconselharam a escolher as farmácias. Comprar em mercado é furada, não adianta tentar esconder no meio das bolachas que certamente a operadora de caixa vai notar e disparar um risinho insinuante. Isso quando não gritam no meio de todos: “Valdenice! Quanto tá a Confort Plus de efeito retardante?”. Essas balconistas de supermercado não têm mesmo um pingo de sensibilidade.

Entrou sem olhar para os lados, tinha de mostrar naturalidade. Percorreu a prateleira de fraldas e a conveniência, depois disfarçou uma olhadela para o lado oposto onde estavam os artigos masculinos e viu os coloridos pacotinhos pendurados próximos à balança.

Para muitos seria simples: pegar, pagar e sair. Um mais abusado encheria uma sacola, cantaria a atendente e ainda perguntaria se não vendem tamanho GG. Mas ele não era disso. Tímido, uma vez escolheu um posto de combustíveis supondo ser mais fácil. Pagou o dobro e ainda saiu por caminhoneiro tarado. Mas essas coisas acontecem, é tudo uma questão de prática.

O que ele não sabia era qual escolher. A opção pelo sabor e/ou efeito da camisinha poderia dizer muito sobre sua personalidade e ele não estava a fim de expor detalhes tão íntimos para todos daquela loja. O que pensariam, por exemplo, se ele escolhesse uma “Hot Sensation com bolinhas explosivas?”. Para não despertar – ainda mais – suspeitas, pegou a tradicional, mas ficou curioso para saber como seriam as tais bolinhas.

Outra regra primordial é que um homem nunca deve comprar camisinhas acompanhado. Se for com a namorada todos vão olhar com aquela cara de “eu sei o que vocês vão fazer hoje à noite, safadinhos!” E se estiver com um amigo a atendente vai lançar o clássico “vocês estão juntos?” e achar que fez a piada do século.

Seguiu até o balcão fazendo o maior esforço para esconder a bendita. Por “sorte”, aquele parecia ser o horário escolhido por todos seus conhecidos do bairro para pagar a conta de água e luz. Pior que esperar na fila é quando vem um solícito vendedor tomando o pacote sob o pretexto de “colocar numa sacolinha”. O garoto respirou fundo e contou até dez, só não esperava a voz esganiçada da infeliz balconista feiosa:

- Ô Claudinei, de quem é a camisinha?
- Do menino de boné laranja e blusa verde, no final da fila. Cobra R$ 1,35.
- Ô menino, pode passar na frente... Ô menino! Menino! Cadê o moleque, Claudinei?!

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