quinta-feira, 27 de outubro de 2011

Tradição para levar o prêmio

João Paulo Santos

 Da série de matérias sobre o "Festival Prato de Butiquim", publicada no jornal O Diário e no portal odiario.com no dia 24 de outubro 

Quando José Rafael Pacheco foi convidado a participar do Festival Prato de Butiquim, não pensou duas vezes: o caldo de mocotó seria o representante do Bar do Rafa na disputa. A especialidade da casa promete ter com o júri o mesmo sucesso que faz com o público há quase 25 anos e conquistar o prêmio de melhor prato de butiquim de Maringá.

O favoritismo, contudo, ele deixa de lado. Rafa, como é conhecido, diz que o sucesso do prato é resultado do cuidado que aprendeu a ter em cada etapa. "Nós só usamos água quente no preparo e tiramos a gordura, que deixa o caldo pesado e não tem química alguma. Esses detalhes deixam o sabor mais puro, mais leve", revela.

Para que sejam servidas no almoço, as peças de mocotó precisam cozinhar por, pelo menos, três horas, até que o caldo fique "apurado" e os ossos se soltem. "Desde as oito [da manhã] já tem panela no fogo. A casa abre às 11 e a qualquer hora que o cliente vier tem caldo pronto". Servido na caneca e decorado com cheiro verde e salsinha, o caldo é servido acompanhado de farinha e pão. A pimenta varia conforme o gosto do cliente.


A paixão com que fala do prato é mesma que rege o bar desde a sua criação, em 1987. Na época funcionário de um banco, Rafa trocou a segurança do terno e gravata pelo sonho de ter um estabelecimento próprio. Com uma "portinha" e apenas uma funcionária, começou a atender e entender do assunto. "Mudava governo, faltava produto e a gente tinha que continuar atendendo. Graças a Deus nunca passei por um momento de crise".


Com o sucesso do caldo de mocotó nos dias frios, o Bar do Rafa garantia sustento para as outras estações do ano. Esse controle em situações difíceis Rafa aprendeu desde cedo, plantando e colhendo soja no sítio de parentes. Da origem simples ele diz carregar a humildade, que passa para clientes e funcionários. "Sempre digo que a gente tem que atender bem, não importa a situação. Desse jeito o cliente gosta do lugar, se sente bem aqui e volta".


A estratégia deu certo, o bar cresceu e hoje chega contar com até doze funcionários em dias de grande movimento. "E ainda falta, tem vez que sai até duzentas porções no mesmo dia. Isso só de mocotó, a gente também serve rabada, dobradinha e outros caldos". Se há planos para o futuro? Para Rafa, o principal plano é "manter o ritmo sem perder a qualidade".


Para conferir
Bar do Rafa: Av. Pedro Taques, 1774, Jardim Alvorada.
Telefone: 3246-7085

segunda-feira, 10 de outubro de 2011

A metade que falta

Oi, tudo bem? Queria ligar, mas... bom, agora não dá né?  Eu só queria dizer que tá tudo bem por aqui, eu consegui aquela vaga que comentei contigo há um tempo atrás, lembra? Naquele dia que você me levou para ver a lua e deitamos no capô do seu carro. Você me dizia que não tinha muito tempo, que queria ir logo para a viagem que programou na faculdade e eu falando de fast-food com um copo de refrigerante na mão. Você ria daquele seu jeito de rir com o meu desinteresse, falava que eu não sabia o tamanho do mundo. Que era muito maior que a nossa cidadezinha... eu achava aquilo viajado, mas agora entendo. Eu conheço o mundo agora e ele me dá medo.

Você dizia que não tinha medo de nada, mas eu sei que não gostava de ficar sozinho.

Todos te chamavam de louco, inclusive eu... mas também, que ideias eram aquelas? Mas é dessa loucura que eu sinto falta, sabia? As coisas aqui são muito sóbrias. A vida é muito cinza do alto desse prédio e Roma não é das mais simpáticas a brasileiros. Esses dias me peguei pensando como seria se você estivesse aqui. Você faria piada com o cara da banca de jornal, depois compraríamos um whisky barato e beberíamos até um não agüentar levar o outro para casa. Encontraríamos um pub – ou seja lá como chamam isso aqui, não tive tempo de conhecer – e faríamos amizade com uma estrangeira que fuma Dunhill. Eu ficaria com ciúmes e você iria rir, como sempre ria das minhas crises de ciúmes.

Você não dormiu com aquela garota do Tribo’s, não é mesmo?

Eu só soube semana passada, mas seu pai esteve por aqui. Queria ter visto ele, poderíamos conversar sobre política e futebol como aqueles dias na sua casa. Eu tentava dar atenção pra ele e você, da cozinha, ficava imitando animais. Eu ria e seu pai não entendia nada, coitado. Sinto falta dele. Quando voltar ao Brasil, não posso esquecer de passar na casa dos seus pais... vou levar um jornal daqui, ele ficava todo orgulhoso em ver o nosso nome, lembra?

Eu fiquei com os seus óculos redondos, você não se importa né?

Semana passada eu acabei com um Jack Daniels que tinha guardado. Pensei na gente e chorei igual criança. Eu não sou dessas que bebe e chora, você sabe, mas aquele dia foi diferente... era o nosso dia, lembra? Eu sentei no sofá e escrevi um poema. É meio piegas e deve ter umas três frases de Vinicius, mas quem liga? São umas frases que eu decorei de tanto você escrever no vidro do quarto. Eu comprei um toca discos só pra ouvir aquele LP de bossa nova que você me deu. Tem noites que eu não consigo dormir e coloco para tocar. Sei lá. Parece que tô com você.

Ele me ligou esses dias. Disse que tá com saudade. Mandei ele para o inferno e disse que cinco anos tinham sido o bastante, que acabou.

Fiquei pensando em como seria se tivesse escolhido passar aquele reveillon no seu apartamento. Quem sabe eu teria percebido que você tava doente, que estava mais magro que o normal. Que o seu cabelo estava caindo. Que já sorria com dificuldade. Eu teria notado, meu amor, a gente teria feito algo. Me contaram que sua mãe te encontrou deitado na escrivaninha, sorrindo.

sexta-feira, 7 de outubro de 2011

A (a)posta do Santo

 

Da série de matérias sobre o "Festival Prato de Butiquim", publicada no jornal O Diário e no portal odiario.com no dia 06 de outubro

Já na entrada do bar você percebe a diferença, a recepção é feita ao som de Mart’nália e o ambiente decorado entre o rústico da madeira e a delicadeza de letras à mão, gravadas na parede. Na batida leve do afro samba, você pode aproveitar para conhecer a “Posta Marinada do Santo”, prato que representa o Santo Bar no Festival Prato de Butiquim, que será realizado em novembro.
 
Enquanto aguarda o preparo – tudo é feito na hora – a sugestão são as famosas batatas em conserva, temperadas com azeite, orégano e sal. Para provar do estilo musical da casa, você espera na companhia de Paula Toller, Tulipa Ruiz ou quem sabe um blues – o “setlist” é recheado. Na cozinha o corte do lagarto, chamado de posta, vai ao fogo.
 
“Para ser servido à noite, a carne descansou o dia todo em molho de azeite com cebola picada e ervas finas”, explica Hamilton Mariano, organizador de eventos e gerente do Santo. Quanto mais tempo a peça “marinar”, mais sabor empresta do tempero. Mariano entende, mas quem toma conta da cozinha é a esposa, Val Fuentes, que se diz apaixonada por culinária.
 
Artista plástica, Val coordenava um ateliê e, ao fim das aulas, reunia as alunas para saborear alguns pratos. Nos encontros, mostrava o que aprendeu com os pais, donos de restaurante. A brincadeira começou a virar tradição e surgiu a ideia de, quem sabe, profissionalizar o projeto. “Mas faltava o lugar”, conta Mariano. “Como sempre moramos ali perto, na Humaitá, passávamos de carro e comentávamos sobre a estrutura, o local”, lembra.
 
 Quando o imóvel que queriam foi desocupado, há cerca de cinco anos, não demorou uma tarde até que o casal, junto com o filho Elton, fechasse negócio. “A ideia era fazer algo diferente, um bar que não fosse o estilo ‘pegapacapá’, comum por aqui”. O projeto encontrou no “setlist” e na decoração a forma de criar o ambiente, e no nome “Santo” o modo de deixar declarado a que veio. Nasceu o Santo Bar e, a partir dele, projetos como o “Sambinha pro Santo”, organizado por Elton.
 
O cardápio diferenciado, ditado por Val e seguido à risca por duas cozinheiras, acompanha a premissa da casa – na cozinha não se vê fritura. “A gente queria que fosse um bar com algo a mais, com pratos mais substanciosos”, explica Mariano. Com a promessa de “cerveja mais gelada de Maringá”, a posta marinada chega à mesa, decorada e pronta para conquistar júri e clientes como melhor prato de butiquim no festival.