segunda-feira, 10 de outubro de 2011

A metade que falta

Oi, tudo bem? Queria ligar, mas... bom, agora não dá né?  Eu só queria dizer que tá tudo bem por aqui, eu consegui aquela vaga que comentei contigo há um tempo atrás, lembra? Naquele dia que você me levou para ver a lua e deitamos no capô do seu carro. Você me dizia que não tinha muito tempo, que queria ir logo para a viagem que programou na faculdade e eu falando de fast-food com um copo de refrigerante na mão. Você ria daquele seu jeito de rir com o meu desinteresse, falava que eu não sabia o tamanho do mundo. Que era muito maior que a nossa cidadezinha... eu achava aquilo viajado, mas agora entendo. Eu conheço o mundo agora e ele me dá medo.

Você dizia que não tinha medo de nada, mas eu sei que não gostava de ficar sozinho.

Todos te chamavam de louco, inclusive eu... mas também, que ideias eram aquelas? Mas é dessa loucura que eu sinto falta, sabia? As coisas aqui são muito sóbrias. A vida é muito cinza do alto desse prédio e Roma não é das mais simpáticas a brasileiros. Esses dias me peguei pensando como seria se você estivesse aqui. Você faria piada com o cara da banca de jornal, depois compraríamos um whisky barato e beberíamos até um não agüentar levar o outro para casa. Encontraríamos um pub – ou seja lá como chamam isso aqui, não tive tempo de conhecer – e faríamos amizade com uma estrangeira que fuma Dunhill. Eu ficaria com ciúmes e você iria rir, como sempre ria das minhas crises de ciúmes.

Você não dormiu com aquela garota do Tribo’s, não é mesmo?

Eu só soube semana passada, mas seu pai esteve por aqui. Queria ter visto ele, poderíamos conversar sobre política e futebol como aqueles dias na sua casa. Eu tentava dar atenção pra ele e você, da cozinha, ficava imitando animais. Eu ria e seu pai não entendia nada, coitado. Sinto falta dele. Quando voltar ao Brasil, não posso esquecer de passar na casa dos seus pais... vou levar um jornal daqui, ele ficava todo orgulhoso em ver o nosso nome, lembra?

Eu fiquei com os seus óculos redondos, você não se importa né?

Semana passada eu acabei com um Jack Daniels que tinha guardado. Pensei na gente e chorei igual criança. Eu não sou dessas que bebe e chora, você sabe, mas aquele dia foi diferente... era o nosso dia, lembra? Eu sentei no sofá e escrevi um poema. É meio piegas e deve ter umas três frases de Vinicius, mas quem liga? São umas frases que eu decorei de tanto você escrever no vidro do quarto. Eu comprei um toca discos só pra ouvir aquele LP de bossa nova que você me deu. Tem noites que eu não consigo dormir e coloco para tocar. Sei lá. Parece que tô com você.

Ele me ligou esses dias. Disse que tá com saudade. Mandei ele para o inferno e disse que cinco anos tinham sido o bastante, que acabou.

Fiquei pensando em como seria se tivesse escolhido passar aquele reveillon no seu apartamento. Quem sabe eu teria percebido que você tava doente, que estava mais magro que o normal. Que o seu cabelo estava caindo. Que já sorria com dificuldade. Eu teria notado, meu amor, a gente teria feito algo. Me contaram que sua mãe te encontrou deitado na escrivaninha, sorrindo.

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